Valquíria Tenório é professora
universitária, socióloga e pesquisadora de cultura e história na temática
etnicorracial.
Durante
toda a semana passada, pegando gancho com o Dia Internacional da Mulher, meus
alunos e alunas apresentaram trabalhos sobre a mulher, leram e analisaram
trechos de entrevistas que fizeram com mulheres de idades diferentes. Deviam
perguntar apenas o que é ser e qual o papel da mulher. Foi isso o que fizeram,
apresentaram e analisaram as falas durante nossas aulas. Algumas alunas
montaram vídeos com as suas entrevistadas, outras trouxeram o áudio, ampliaram
a pesquisa e trouxeram vídeos sobre a importância do dia da mulher, a maioria das/os
estudantes se dedicou à realização do trabalho. Nossa hipótese era a de que
mulheres de gerações diferentes teriam visões diferentes do ser e do papel da
mulher.
Durante
a semana, nas diversas apresentações do que as entrevistadas responderam fomos
comprovando ou não essa hipótese inicial. As entrevistas foram realizadas com
mulheres conhecidas, muitas vezes da família, do círculo de amizade,
professoras, em alguns poucos casos as/os estudantes se lançaram a entrevistar
mulheres totalmente desconhecidas que encontraram, por exemplo, na praça, no
ponto de ônibus. O interessante é que as/os
estudantes aceitaram o desafio. A maioria relatou a dificuldade que muitas
mulheres sentiam em responder suas indagações. Elas diziam que nunca tinham
pensado sobre o que é ser mulher. A orientação foi a de que as/os estudantes
não deviam sugerir respostas, deviam apenas anotar o que era dito.
Sem
dúvida, foi uma atividade interessante, de primeiro contato com o mundo da
pesquisa e da análise sociológica. Mulheres de 14 a 88 anos se fizeram
presentes em nossa sala de aula, por meio de suas falas. E, as reflexões sobre
o que disseram tomaram conta das/os estudantes. Tivemos discussões acaloradas
sobre a naturalização do ser mulher e também de seu papel. Fomos refletindo
sobre isso, como o ser e o papel da mulher vai sendo forjado desde antes do
nascimento, com os brinquedos ganhos, as bonecas, panelinhas, casinhas, numa
referência evidente sobre o ser mãe e cuidadora da casa e família. E, essa foi
a fala mais frequente que as/os estudantes encontraram em suas entrevistadas,
mesmo algumas mais jovens mencionaram essa característica. Nós avaliamos juntos
que não há problema se a mulher quer ser mãe, quer cuidar da casa, o problema
está em se ter apenas isso como possibilidade, ou nem ter a possibilidade de
escolher.
Conseguimos
entender que deveríamos ampliar os critérios para as entrevistas, os/as
estudantes concordaram que para saber melhor sobre as respostas das
entrevistadas deveríamos ter outras informações como escolaridade, formação
profissional, raça/cor, religião, lugar de moradia, e eles/as foram elencando a
necessidade de um perfil mais completo dessas mulheres entrevistadas.
Foi
interessante quando um estudante durante sua apresentação disse que a ideia de
mulher como frágil não era verdade. Ele trouxe o exemplo da avó que já tinha
feito muito trabalho pesado e, atualmente, dirige um caminhão, enfrentando o
preconceito na empresa em que atua, mas vencendo todos eles e se destacando na
profissão para muitos tida como masculina. A fala do estudante vinha repleta de
orgulho e buscava demonstrar para as/os demais, a partir da experiência própria,
que o papo de mulher frágil não era verdadeiro. Realmente, a mulher não é
frágil, mas sim fragilizada, constantemente, pela sociedade, pois ela pode e
consegue ter as mesmas funções que os homens, basta aprender, basta ter
condições iguais para praticar, basta ter oportunidades.
A
ONU Mulheres lançou em 2015 a campanha “Por um planeta 50-50 em 2030: um passo
decisivo pela igualdade de gênero”, para que os governos assumam o compromisso
de enfrentar os desafios que impedem que as mulheres desenvolvam suas
potencialidades, combatendo a violência contra a mulher, elaborando e
promovendo políticas públicas capazes de garantir uma nova realidade para as
mulheres e também para a sociedade como um todo. A educação tem um papel
importante para essa campanha começando desde muito cedo, evitando-se as
naturalizações, a atribuição de papeis específicos para meninos e meninas,
abrindo-se as possibilidades para a formação e para a construção das
identidades.