terça-feira, 22 de março de 2016

Pensando sobre Diversidade


Valquíria Tenório é professora universitária, socióloga e pesquisadora de cultura e história na temática etnicorracial.


            Os dias atuais são propícios para pensarmos sobre diversidade: de pessoas, ideias, posturas, visões, culturas, ideologias, histórias, lugares e tempos. Há muito para se pensar! Olho para o Brasil de hoje e penso ainda mais sobre isso. Olho para a minha sala de aula e vejo uma diversidade incrível, de rostos, jeitos, olhares, desejos, motivações, histórias. Como lidar com a diferença, com a multiplicidade em diversos sentidos? Tenho me dedicado a pensar a questão da educação, por isso fico me perguntando como a diversidade pode ser tratada em sala de aula. Estou no processo, não tenho respostas, mas não quero me furtar a refletir sempre sobre a minha prática pedagógica. 
            Segundo a professora doutora Nilma Lino Gomes em artigo sobre diversidade e currículo escolar, “aspectos tipicamente observáveis, que se aprende a ver como diferentes, só passaram a ser percebidos dessa forma porque os sujeitos sociais, no contexto da cultura, assim os nomearam e identificaram.”. Nós construímos as diferenças no contato com o outro, a partir da maneira como o olhamos, como buscamos nos enxergar ou não nele. São os indivíduos vivendo em sociedade que nomeiam e identificam as diferenças que observam, mas lembremos, essa nomeação é pautada naquilo que é conhecido e reconhecido por eles no decorrer da história. É através do reconhecimento da diversidade que podemos qualificar e entender a nossa individualidade.
            A diversidade no processo educacional é, muitas vezes, ignorada, negada, invisibilizada, difícil de ser trabalhada na realidade em que nós professores estamos inseridos, submetidos e aos quais submetemos nossos alunos e alunas. Dessa forma, como poderíamos pensar a sala de aula de hoje com indivíduos diferentes, desejosos de reconhecimento, tendo que se submeter à mesma forma de aula, tratados da mesma maneira, avaliados sobre o mesmo padrão? As pessoas têm o que lhes é mais rico, suas diferenças, mas como lidar com elas se a educação foi se transformando em uma educação massificada, padronizada para valorizar uma falsa ideia de um conhecimento universal e uma vida de obrigações?
            As pessoas se acostumam com essa ideia e assim passa a ser tão comum ouvirmos dizer que não seria bom se todos fôssemos iguais, se todos pensássemos da mesma maneira, tivéssemos os mesmos gostos? Ser diferente não pode ser algo ruim. O humano diferente dos outros animais tem sua singularidade e diversidade moldada pela cultura, pela maneira como escolhem lidar com suas dificuldades e suas vidas. A diversidade, a multiplicidade é enriquecedora. As pessoas têm suas singularidades, mas, no mundo de hoje, parece-me ainda que um discurso homogeneizante tende a querer apagá-las em prol de uma unicidade irreal. Gosto de pensar que somos diferentes e que essas diferenças podem se complementar, podem trazer mais conhecimento, contato, convívio. Para Nilma Lino Gomes, “faz-se necessário o rompimento com a postura de neutralidade diante da diversidade que ainda se encontra nos currículos e em várias iniciativas de políticas educacionais, as quais tendem a se omitir, negar e silenciar diante da diversidade.”
            Essa complexidade não para por aqui, porque estão em jogo as relações de poder e dominação vigentes na sociedade que classificam e/ou hierarquizam as diferenças nomeando indivíduos e grupos como mais ou menos, como superiores ou inferiores, como bonitos ou feios, inteligentes ou não, capazes ou incapazes. Ao longo da história, indivíduos e grupos vêm sendo inferiorizados por suas diferenças, estes grupos, hoje, buscam reconhecimento, buscam ter sua história registrada, mostrada. É necessário que reflitamos sobre como as diferenças são hierarquizadas, tornadas naturais, como elas impedem indivíduos e grupos de vivenciarem uma vida plena.
            Se prezamos a diversidade, devemos prezar também a diferença e lutar para que ela seja garantida, ouvida, trazida à tona. Essa reflexão é só o começo, continuemos discutindo esse tema em uma próxima oportunidade.