Valquíria Tenório é professora
universitária, socióloga e pesquisadora de cultura e história na temática
etnicorracial.
Os dias
atuais são propícios para pensarmos sobre diversidade: de pessoas, ideias,
posturas, visões, culturas, ideologias, histórias, lugares e tempos. Há muito
para se pensar! Olho para o Brasil de hoje e penso ainda mais sobre isso. Olho
para a minha sala de aula e vejo uma diversidade incrível, de rostos, jeitos,
olhares, desejos, motivações, histórias. Como lidar com a diferença, com a
multiplicidade em diversos sentidos? Tenho me dedicado a pensar a questão da
educação, por isso fico me perguntando como a diversidade pode ser tratada em
sala de aula. Estou no processo, não tenho respostas, mas não quero me furtar a
refletir sempre sobre a minha prática pedagógica.
Segundo a
professora doutora Nilma Lino Gomes em artigo sobre diversidade e currículo
escolar, “aspectos tipicamente observáveis, que se aprende a ver como
diferentes, só passaram a ser percebidos dessa forma porque os sujeitos
sociais, no contexto da cultura, assim os nomearam e identificaram.”. Nós
construímos as diferenças no contato com o outro, a partir da maneira como o
olhamos, como buscamos nos enxergar ou não nele. São os indivíduos vivendo em
sociedade que nomeiam e identificam as diferenças que observam, mas lembremos,
essa nomeação é pautada naquilo que é conhecido e reconhecido por eles no
decorrer da história. É através do reconhecimento da diversidade que podemos
qualificar e entender a nossa individualidade.
A
diversidade no processo educacional é, muitas vezes, ignorada, negada,
invisibilizada, difícil de ser trabalhada na realidade em que nós professores
estamos inseridos, submetidos e aos quais submetemos nossos alunos e alunas.
Dessa forma, como poderíamos pensar a sala de aula de hoje com indivíduos
diferentes, desejosos de reconhecimento, tendo que se submeter à mesma forma de
aula, tratados da mesma maneira, avaliados sobre o mesmo padrão? As pessoas têm
o que lhes é mais rico, suas diferenças, mas como lidar com elas se a educação
foi se transformando em uma educação massificada, padronizada para valorizar
uma falsa ideia de um conhecimento universal e uma vida de obrigações?
As
pessoas se acostumam com essa ideia e assim passa a ser tão comum ouvirmos
dizer que não seria bom se todos fôssemos iguais, se todos pensássemos da mesma
maneira, tivéssemos os mesmos gostos? Ser diferente não pode ser algo ruim. O
humano diferente dos outros animais tem sua singularidade e diversidade moldada
pela cultura, pela maneira como escolhem lidar com suas dificuldades e suas
vidas. A diversidade, a multiplicidade é enriquecedora. As pessoas têm suas
singularidades, mas, no mundo de hoje, parece-me ainda que um discurso
homogeneizante tende a querer apagá-las em prol de uma unicidade irreal. Gosto
de pensar que somos diferentes e que essas diferenças podem se complementar,
podem trazer mais conhecimento, contato, convívio. Para Nilma Lino Gomes, “faz-se
necessário o rompimento com a postura de neutralidade diante da diversidade que
ainda se encontra nos currículos e em várias iniciativas de políticas
educacionais, as quais tendem a se omitir, negar e silenciar diante da
diversidade.”
Essa
complexidade não para por aqui, porque estão em jogo as relações de poder e
dominação vigentes na sociedade que classificam e/ou hierarquizam as diferenças
nomeando indivíduos e grupos como mais ou menos, como superiores ou inferiores,
como bonitos ou feios, inteligentes ou não, capazes ou incapazes. Ao longo da
história, indivíduos e grupos vêm sendo inferiorizados por suas diferenças,
estes grupos, hoje, buscam reconhecimento, buscam ter sua história registrada,
mostrada. É necessário que reflitamos sobre como as diferenças são
hierarquizadas, tornadas naturais, como elas impedem indivíduos e grupos de
vivenciarem uma vida plena.
Se prezamos a diversidade, devemos prezar também a
diferença e lutar para que ela seja garantida, ouvida, trazida à tona. Essa
reflexão é só o começo, continuemos discutindo esse tema em uma próxima
oportunidade.