Valquíria Tenório é professora
do IFSP campus Matão, doutora em Sociologia e pesquisadora de cultura, história
e educação na temática etnicorracial.
Não
acompanhei as Olímpiadas, mas soube de diversos casos que nos fazem refletir
sobre o país onde vivemos e sobre nossa formação enquanto nação e aqui não
estou me referindo às questões políticas atuais, tampouco os problemas nas
obras para que a Olímpiada fosse possível no Rio de Janeiro, o discurso para um
grande evento como esse nos dava a impressão de sobrar um grande legado para a
população em termos de obras públicas, mas não foi isso exatamente o que
aconteceu. Bem, isso é outro assunto.
Fiquei
pensando mais sobre as questões que envolvem a temática que estudo e vivencio,
mais especificamente o caso do ginasta brasileiro, negro, Ângelo Assunção que
denunciou as “brincadeiras” e “piadas” que colegas da mesma equipe fizeram a
respeito de sua cor antes dos jogos. Ângelo não esteve entre os convocados para
as Olímpiadas.
Tenho
conversado muito com meus alunos(as) sobre o fato de tudo o que vivemos em
nossa sociedade não ser natural, mas sim naturalizado e a necessidade constante
de estranharmos diversas situações, entre elas o racismo nosso de todo dia. Eu
sei que já falei sobre isso em outros artigos dessa coluna, mas é
imprescindível falarmos sempre, inclusive quando acabo de iniciar um curso de
formação para professores nessa temática.
Quando
digo que as situações não são naturais estou dizendo que elas são criadas pela
sociedade, têm historicidade, são exteriores aos indivíduos e são aprendidas,
passadas de geração a geração, pelas famílias, pela escola e outras
instituições sociais. Essa característica é bastante importante, pois se
aprendemos ser de uma maneira esperamos que possa ser possível aprender e
ensinar ser de outra.
No
caso do racismo tenho batido muito no ponto de que “piadas” e “brincadeiras”
não são inocentes. Para aprofundar essa discussão é muito interessante a
análise que o Prof. Dr. Dagoberto José Fonseca da Unesp de Araraquara faz em
seu livro “Você conhece aquela? A piada, o riso e o racismo à brasileira”.
Segundo ele, a “piada não é inocente, não é ingênua. Ela tem como fundamento a
ridicularização, a desqualificação do outro”. No livro ele traz 20 piadas
feitas sobre negros e passa a analisa-las, estabelecendo uma relação entre
história e antropologia.
Aquela piada contada para descontrair, acaba por
menosprezar o outro e pode dizer muito da maneira como as nossas relações
sociais têm sido construídas. E esse é um ponto importante, nossas relações são
construídas e as piadas têm a capacidade de reproduzir situações, relações,
assimetrias, hierarquias, racismo, machismo, sexismo. É importante pensarmos
sobre como as relações entre negros e brancos no Brasil são construídas, a
piada pode nos ajudar nessa reflexão.