Valquíria Tenório é professora
do IFSP campus Matão, doutora em Sociologia e pesquisadora de cultura, história
e educação na temática etnicorracial.
Daqui poucos dias terá início a outra metade do meu
caminho. Estatisticamente, terei alcançado o meio da vida. O tempo me avisa e
me chama para fazer aqueles balanços, me cutuca a olhar para o que já passou e
projetar o futuro. Tudo muito típico quando se está prestes a fazer
aniversário, sensação previsível. No entanto, esse ano sinto algo diferente,
talvez seja a idade que ora se prenuncia e com ela alguns rótulos que não
parecem dar conta dos sentimentos internos e da maneira como ainda me vejo.
A imagem que eu tinha quando mais jovem sobre
determinadas idades, não condiz mais a minha realidade e ao que sinto hoje em
dia. Felizmente, não saltamos décadas, envelhecemos gradualmente, caso
contrário a estranheza seria ainda maior.
O corpo não é o mesmo, um fio branco na sobrancelha,
outros pelos cabelos, a pele que já não tem a mesma textura de antes. Não
adianta os amigos dizerem que a genética me ajuda, eu sei que o tempo passou e
que as marcas ficam. A nova idade quando pronunciada em voz alta não me causa
calafrios, porém não parece fazer parte de mim. Eu sei, vocês vão dizer que
estou exagerando. Mas, eu já anunciei no início desse texto, aniversário causa
essas sensações e sentimentos mesmo.
Então, resolvo fazer o tal balanço e vejo que o saldo é
positivo, tenho vivido com intensidade, tenho conquistas. Minha identidade se
transformou nas últimas décadas: filha, amiga, estudante, negra, esposa, mãe, pesquisadora,
professora. Tantas características esperadas, aprendidas e compartilhadas,
outras tantas descobertas a partir da vivência e experiências únicas. Quanto
aprendi a meu respeito a partir do convívio com o outro, na relação cotidiana,
na convivência, na preocupação em estabelecer empatia. Não sou perfeita! Longe
disso, mas sei que busco sempre me aprimorar, mesmo que não consiga, estou
sempre disposta. Penso ser essencial estarmos dispostos ao aprimoramento, a
ouvir, a sentir, a estabelecermos contato conosco e com os outros. Como é
importante nos conhecermos ou, ao menos, tentarmos. Como é importante estarmos
cientes de que generalizar tudo é sempre um risco que pode ser evitado.
Que os próximos 40 anos me mantenham nessa meta e
vibração!