terça-feira, 22 de novembro de 2016

Escolhas brasileiras


Valquíria Tenório é professora do IFSP campus Matão, doutora em Sociologia e pesquisadora de cultura, história e educação na temática étnico-racial.

Aprender é algo importante desde a mais tenra idade. Vivemos aprendendo e aprendemos vivendo. Primeiro, no contato com nossos pais, irmãos, no seio da nossa família, depois ampliamos um pouco as fontes que nos oferecem aprendizado. A escola é uma dessas fontes e, a meu ver, a mais importante instituição para que o conhecimento seja construído, transmitido, ampliado. É a base de uma sociedade. Educação e escola atingem a todos os cidadãos. Ela não é o único espaço para o aprendizado, mas é, sem dúvida, o mais abrangente.
Nos últimos anos essa constatação tem sido a minha justificativa para desenvolver e coordenar cursos de formação/atualização de professores, afinal se um conhecimento precisa ser multiplicado não haveria personagem mais importante para isso do que o professor. É esse público que tenho escolhido para atingir muito mais pessoas. Cada projeto desenvolvido me faz manter a escolha e valorizar ainda mais o papel social dos professores.
O conhecimento é algo fascinante! O quanto de novo podemos aprender? Felizmente, não há um limite, não há uma idade para se deixar de aprender. Mas, pode haver resistências construídas no passar do tempo, ideias sedimentadas, incrustadas bem fundo. Pode haver perda da capacidade ou da vontade de dialogar, podemos nos fechar em uma perspectiva e não nos abrir para outras possibilidades.
Quando pensamos educação de um país, devemos levar em consideração que tipo de educação queremos e que tipo de educação querem nos oferecer ou nos impor. Reformas são importantes, porque a educação precisa acompanhar as mudanças sociais, mas de que maneira elas devem acontecer? Quem serão os protagonistas? Quais mudanças são escolhidas para embasar uma reforma? Qual a amplitude, impactos, condições concretas de uma reforma ocorrer e ser bem-sucedida? Não há como não pensar que tudo o que se passa no mundo social é construído pelos seres humanos e fruto de um jeito de olhar para o que lhes acontece.
Essas poucas linhas são reflexões que se avolumam a cada dia nas discussões com os colegas de profissão sobre as atuais propostas de reforma da educação brasileira, a partir das nossas experiências comuns, ou ainda por meio do curso que temos realizado no IFSP campus Matão sobre História e Cultura Africana e Afro-Brasileira. Vocês podem não acreditar, mas uma aula de Arte e, especialmente, de Arte Afro-Brasileira, pode nos fazer enxergar o quanto o Brasil que temos é fruto de escolhas.
Ficou bastante evidente para quem participou da aula conduzida pela professora Christiane Tragante e por uma turma muito interessada, que existe uma gama de artistas, para se ficar apenas nas artes visuais, negros(as) com produção riquíssima, conhecimento, premiações, mas que não foram e não são escolhidos para representar a identidade brasileira. Exatamente isso, não foram escolhidos, pois se tinham a mesma capacidade, porque não tiveram e ainda não têm o mesmo reconhecimento?
               Tem havido um tipo de preferência nas escolhas no Brasil, de como ser, de que país somos ou queremos ser, o que tem levado à invisibilização de outras escolhas possíveis de maneira constante na história do nosso país. Se, por exemplo, temas como história e cultura africana e afro-brasileira deixarem de constar nas leis de educação e no currículo escolar, parece-me que a preferência nas escolhas volta a não representar a maioria de nossa população como sempre foi. É necessário refletir e lutar para que haja mais representação e não menos.