sábado, 17 de dezembro de 2016

Rico aprendizado

                                Valquíria Tenório é professora do IFSP campus Matão, 
doutora em Sociologia e pesquisadora de cultura, 
história e educação na temática étnico-racial.

O curso de Formação Inicial e Continuada “História e Cultura Africana e Afrobrasileira” foi realizado desde agosto deste ano no IFSP, campus Matão. Foram várias semanas de rico aprendizado compartilhado, vivido intensamente pelos cursistas e professores. E não poderia deixar de registrar a última aula realizada no dia 03 de dezembro.
O curso foi idealizado para ser de formação de professores e cumpriu esse objetivo. Foi heterogêneo no público atendido, uma vez que tivemos professores(as) de diversas disciplinas participando do curso, de história, biologia, língua portuguesa, educação física, sociologia, filosofia, tivemos ainda estudantes de licenciatura, de mestrado e doutorado e também da educação infantil. Formamos um grupo forte, de reflexões preciosas, de muita discussão e debate, de muito respeito e dedicação. Alguns participantes já vinham de edições de cursos anteriores que tive a oportunidade de coordenar. Nossos encontros foram prazerosos, mesmo que estivéssemos tratando temas, muitas vezes, intragáveis. Eram prazerosos, pois havia interesse, dedicação em entender e colocar certas questões. Iniciávamos com um café feito coletivamente, afinal é sempre necessário alimentarmos o corpo. E esse fazer coletivo era também um aprendizado, estávamos juntos, nos preocupávamos uns com os outros.
A última aula teve início com uma visita/encontro ao nosso Baobá, espécie símbolo do continente africano que tivemos a honra de plantar em 2014 no encerramento de um outro curso de formação de professores realizado também em Matão. Foi um momento lindo! Fizemos um círculo ao redor dele, lemos poesias e trocamos energias. Tenho acompanhado o crescimento desta árvore, afinal não basta plantar, é preciso cuidar, por isso não poderia deixar de apresentá-la aos demais. O baobá é uma árvore muito longeva, por isso, espero que meu filho, que nos ajudou em seu plantio possa continuar conectado a ele e passe esse vínculo às gerações futuras, porque serão elas que o verão mais frondoso. 
            Voltamos para a sala de aula emocionados com esse encontro, de uma certa maneira nos conectamos aos nossos ancestrais. Tivemos a oportunidade de ouvir em vídeo conferência o historiador e professor Dr. Amilcar Araújo Pereira da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) um amigo querido com quem aprendo muito. Ele nos ajudou a refletir sobre as ações afirmativas e a superação do racismo, sobre o quanto é importante construirmos um caminho histórico das ações afirmativas, sobre a necessidade de mexermos com privilégios incrustados na nossa formação nacional. Amilcar focou a importância da lei 10.639/03 que instituiu o ensino de história e cultura africana e afrobrasileira e seu papel revolucionário como uma ação afirmativa, uma vez que se busca romper com uma visão eurocêntrica bastante evidente nos nossos currículos escolares.
            Tivemos também a participação da historiadora, professora, mestranda em Educação pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e amiga, Luana Tolentino, falando conosco sobre feminismo negro e sua experiência em sala de aula. Luana tem construído uma prática pedagógica baseada no respeito, na troca com os alunos e no combate ao racismo. Relatou suas lutas, dificuldades, mas também as conquistas. Sua história de vida é prova de seu compromisso com uma educação inclusiva, libertadora, plural. Com certeza, foi um ganho para nós saber sobre sua trajetória e sobre o papel da mulher negra em sala de aula e fora dela. Vocês podem pesquisar sobre esses dois importantes professores com facilidade na internet, encontrando artigos e livros escritos por eles.
Ser plural foi um objetivo do curso, plural nos temas, nas linguagens, nos professores convidados e seus diferentes sotaques, afinal ser negro é ser plural. Sentimos que é preciso criarmos outros referenciais, pensarmos outras perspectivas, pois o Brasil é rico em negritudes, em maneiras e estratégias que a população negra vem criando para existir, para resistir.

Encerramos nossa aula com uma feijoada, proposta pelos cursistas, feita e apreciada coletivamente, porque um dos valores civilizatórios afro-brasileiros é a cooperatividade, o cuidar um do outro. Agora, fica o convite para não nos perdermos, para que criemos outros momentos para estarmos juntos. 2017 promete!