Valquíria
Tenório é professora do IFSP campus Matão,
doutora em Sociologia e pesquisadora
de cultura,
história e educação na temática étnico-racial.
O curso de Formação Inicial e
Continuada “História e Cultura Africana e Afrobrasileira” foi realizado desde
agosto deste ano no IFSP, campus Matão. Foram várias semanas de rico
aprendizado compartilhado, vivido intensamente pelos cursistas e professores. E
não poderia deixar de registrar a última aula realizada no dia 03 de dezembro.
O curso foi idealizado para ser de
formação de professores e cumpriu esse objetivo. Foi heterogêneo no público
atendido, uma vez que tivemos professores(as) de diversas disciplinas
participando do curso, de história, biologia, língua portuguesa, educação
física, sociologia, filosofia, tivemos ainda estudantes de licenciatura, de
mestrado e doutorado e também da educação infantil. Formamos um grupo forte, de
reflexões preciosas, de muita discussão e debate, de muito respeito e
dedicação. Alguns participantes já vinham de edições de cursos anteriores que
tive a oportunidade de coordenar. Nossos encontros foram prazerosos, mesmo que
estivéssemos tratando temas, muitas vezes, intragáveis. Eram prazerosos, pois
havia interesse, dedicação em entender e colocar certas questões. Iniciávamos
com um café feito coletivamente, afinal é sempre necessário alimentarmos o
corpo. E esse fazer coletivo era também um aprendizado, estávamos juntos, nos
preocupávamos uns com os outros.
A última aula teve início com uma
visita/encontro ao nosso Baobá, espécie símbolo do continente africano que
tivemos a honra de plantar em 2014 no encerramento de um outro curso de
formação de professores realizado também em Matão. Foi um momento lindo!
Fizemos um círculo ao redor dele, lemos poesias e trocamos energias. Tenho
acompanhado o crescimento desta árvore, afinal não basta plantar, é preciso
cuidar, por isso não poderia deixar de apresentá-la aos demais. O baobá é uma
árvore muito longeva, por isso, espero que meu filho, que nos ajudou em seu
plantio possa continuar conectado a ele e passe esse vínculo às gerações
futuras, porque serão elas que o verão mais frondoso.
Voltamos
para a sala de aula emocionados com esse encontro, de uma certa maneira nos
conectamos aos nossos ancestrais. Tivemos a oportunidade de ouvir em vídeo
conferência o historiador e professor Dr. Amilcar Araújo Pereira da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) um amigo querido com quem aprendo
muito. Ele nos ajudou a refletir sobre as ações afirmativas e a superação do
racismo, sobre o quanto é importante construirmos um caminho histórico das
ações afirmativas, sobre a necessidade de mexermos com privilégios incrustados
na nossa formação nacional. Amilcar focou a importância da lei 10.639/03 que instituiu
o ensino de história e cultura africana e afrobrasileira e seu papel
revolucionário como uma ação afirmativa, uma vez que se busca romper com uma
visão eurocêntrica bastante evidente nos nossos currículos escolares.
Tivemos
também a participação da historiadora, professora, mestranda em Educação pela
Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e amiga, Luana Tolentino, falando
conosco sobre feminismo negro e sua experiência em sala de aula. Luana tem
construído uma prática pedagógica baseada no respeito, na troca com os alunos e
no combate ao racismo. Relatou suas lutas, dificuldades, mas também as
conquistas. Sua história de vida é prova de seu compromisso com uma educação
inclusiva, libertadora, plural. Com certeza, foi um ganho para nós saber sobre
sua trajetória e sobre o papel da mulher negra em sala de aula e fora dela.
Vocês podem pesquisar sobre esses dois importantes professores com facilidade
na internet, encontrando artigos e livros escritos por eles.
Ser plural foi um objetivo do curso,
plural nos temas, nas linguagens, nos professores convidados e seus diferentes
sotaques, afinal ser negro é ser plural. Sentimos que é preciso criarmos outros
referenciais, pensarmos outras perspectivas, pois o Brasil é rico em
negritudes, em maneiras e estratégias que a população negra vem criando para
existir, para resistir.
Encerramos nossa aula com uma
feijoada, proposta pelos cursistas, feita e apreciada coletivamente, porque um
dos valores civilizatórios afro-brasileiros é a cooperatividade, o cuidar um do
outro. Agora, fica o convite para não nos perdermos, para que criemos outros
momentos para estarmos juntos. 2017 promete!